Por: Neirevane Nunes Ferreira de Souza*

A avaliação de Impacto Ambiental é um dos principais instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente, sendo essencial para o processo de licenciamento ambiental de um determinado empreendimento. A Resolução CONAMA 001/86 estabelece sobre as definições, as responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para uso e implementação da Avaliação de Impacto Ambiental como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente. Em seu Artigo 5°, inciso 3°, a Resolução detalha os fundamentos do estudo de impacto ambiental:

Artigo 5o. – O estudo de impacto ambiental, além de atender à legislação, em especial os princípios e objetivos expressos na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, obedecerá às seguintes diretrizes gerais: III – Definir os limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza

Em relação as áreas de influência, não há na legislação em vigor definições claras quanto aos critérios de delimitação destas áreas, pois estas definições dependem do alcance dos impactos do empreendimento em questão. As Áreas de Influência consistem da demarcação das unidades espaciais de análise para a elaboração do diagnóstico ambiental, como também, para a avaliação dos potenciais impactos ambientais decorrentes da implantação e operação do empreendimento, visando a proposição de medidas mitigadoras/compensatórias.

Segundo Omoto (2006), a área de influência define: Área de estudos e de identificação de impactos; Órgãos públicos a serem consultados; Locais de audiências públicas; Inclusão ou exclusão de pessoas ou grupos de pessoas, comunidades indígenas e/ou tradicionais e competência administrativa e jurisdicional.

Através dessa metodologia é possível fazer uma avaliação mais ampla dos impactos resultantes do empreendimento, pois são consideradas escalas locais e regionais. Para que ocorra a aprovação de obras ou regulamentação de empreendimento já existente, são necessários os estudos para mensurar e avaliar os possíveis impactos. De acordo com a Resolução CONAMA 001/86, Área de Influência de um empreendimento abrange a extensão geográfica a ser direta e indiretamente afetada pelos impactos gerados nas fases de planejamento, implantação e operação deste. Para tanto, as áreas de influência do empreendimento foram classificadas em três níveis, a saber:

Área Diretamente Afetada (ADA) – corresponde à área utilizada pelo empreendimento que sofrerá a ação direta da operação e ampliação do empreendimento. ​ Na ADA são considerados os meios: biótico, físico e socioeconômico, sendo identificada a população atingida e analisados os impactos.

Área de Influência Direta (AID) – corresponde a uma extensão da Área Diretamente Afetada (ADA), mais abrangente, que sofrerá os impactos diretos da operação e ampliação do empreendimento;

Área de Influência Indireta (AII) – corresponde à área real ou potencialmente pode ser afetada sujeita pelos impactos indiretos da operação e ampliação do empreendimento e tem como critério de análise uma escala com caráter regional. Engloba as duas outras áreas (ADA e AID), conforme figura abaixo:

                                                                                             Figura 1: Área de Influência

Para realizar a delimitação das áreas de influência nos estudos ambientais, são considerados os impactos sobre os meios biótico, físico e socioeconômico. O meio biótico se relaciona aos seres que têm vida, como a fauna e a flora. O meio físico é o que sustenta a vida no meio biótico e inclui o ar, as águas, o clima e o solo. O meio socioeconômico faz a relação entre a população afetada, com fatores sociais, culturais e econômicos (CASTRO & LEAL, 2019).

Qualquer empreendimento no espaço urbano gera impactos no âmbito das relações sociais, culturais, econômicas e políticas na área do seu entorno. Por isso, dentro dos estudos ambientais é imprescindível o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), mais um importante instrumento da política ambiental e urbana. O Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança (EIV) foi normatizado no artigo 4º, VI, da Lei 10.257/2001 do Estatuto da Cidade, esta mesma lei deixou a cargo dos municípios a definição de empreendimentos sujeitos ao EIV para obter licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento no âmbito local. A Área de Influência do empreendimento deve ser delimitada considerando todos os possíveis impactos, podendo ir além dos limites do município ou até mesmo do próprio Estado. Assim sendo, as áreas de influência são as aquelas em que podem ser percebidas as consequências do impacto ambiental.

Os impactos são classificados como diretos e indiretos:

Impactos Diretos – São aqueles que tem relação direta de causa e efeito a partir de uma intervenção humana sobre o meio ambiente.

Impactos Indiretos – São aqueles cuja relação de causa e efeito tem uma ação intermediária.

Omoto (2006) ressalta que: “os impactos indiretos podem ser tão ou mais significativos que impactos diretos”.

Nas áreas de influência dos estudos ambientais é fundamental também a participação da comunidade no processo de fiscalização, a população afetada tem o direito de participar ativamente das decisões políticas ambientais, visto que, os danos ambientais são coletivos. Essa participação popular é assegurada na Declaração do Rio de Janeiro sobre o meio ambiente no Princípio 10: A melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisórios. Os Estados, por sua vez, deverão promover a conscientização e a participação popular, colocando as informações à disposição de todos. Além disso, deverá ser proporcionado o acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que se refere à compensação e reparação de danos (ONU, 1992).

Infelizmente, é o não conseguimos observar na prática, a população afetada pelo empreendimento não é envolvida na avaliação dos impactos ambientais e nem nos processos decisórios, como também, não recebe a informação e o apoio jurídico/ administrativo necessários para pleitear as a reparação integral dos danos causados pelo empreendimento. Essa é a realidade das comunidades que hoje vivem em isolamento socioeconômico no que restou dos bairros atingidos pela exploração predatória de sal-gema. A população dos Flexais, Quebradas, Rua Marquês de Abrantes e da Rua Santa Luzia no Saem, tiveram todos os seus direitos individuais e coletivos violados através das ações e tratativas da Braskem sobre a situação de vulnerabilidade destas. Vale ressaltar que essas comunidades remanescentes fazem parte do passivo ambiental da mineradora, uma vez que estão inseridas nas áreas de influência direta e indireta.

O passivo ambiental representa o valor econômico referente aos danos ambientais e sociais que não foram ainda reparados e que a empresa causadora dos danos tem por obrigação de arcar: “A essência do passivo ambiental está no controle e reversão dos impactos das atividades econômicas sobre o meio natural, envolvendo, portanto, todos os custos das atividades que sejam desenvolvidas nesse sentido, podendo os danos ambientais serem relativos a recursos hídricos, à atmosfera, ao solo e ao subsolo, perda da biodiversidade, danos à saúde e à qualidade de vida, impactos na atividade econômica e, por fim, impactos sociais e culturais”(MALAFAIA,2004).

A Braskem, como empresa devidamente licenciada deve tornar público os estudos de impacto ambiental e assumir a responsabilidade sobre o passivo ambiental que tem em relação à população remanescente que se encontra nas áreas de influência direta e indireta. É importante salientar que no acordo firmado entre a Força Tarefa e a Braskem não foi levado em consideração a delimitação dessas áreas de influência que obrigatoriamente devem fazer parte do processo de licenciamento da empresa. É fato que para que a Braskem continue suas atividades é necessário que periodicamente as licenças sejam renovadas e para que isso ocorra são necessários estudos básicos atualizados sobre os impactos causados por sua mineração ao meio ambiente e a população.

Como a Braskem foi instalada na década de 70, então denominada Salgema Indústrias Químicas S.A., bem antes da Resolução CONAMA 001 de 23 de janeiro de 1986, possivelmente, o EIA/RIMA (Estudo e Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental) não foram realizados e consequentemente as áreas de influência não foram definidas. Em pesquisa realizada no site do IMA, não foi encontrado EIA/RIMA da Braskem, como também não foi encontrado um Termo de Referência para avaliação de impacto ambiental voltado para essa atividade mineradora. Mesmo que a Braskem esteja utilizando de Plano de Controle Ambiental (PCA) ou estudo similar aprovado pelo IMA para poder obter licença ambiental anual de renovação da exploração da sal-gema, a partir de 1986 o IMA deveria ter exigido da Salgema o EIA/RIMA. A Braskem, como os demais empreendimentos devem se adequar a legislação vigente.

O órgão estadual responsável pelo licenciamento e fiscalização deste e de outros empreendimentos, o Instituto do Meio Ambiente (IMA) tem o dever de zelar para que a legislação ambiental seja respeitada, garantindo os direitos individuais e coletivos da população afetada a um ambiente sustentável.

Portanto, é questionável a não utilização das áreas de influência como referência para as remoções que se fazem necessárias dessas comunidades remanescentes, tendo em vista a gama de danos causados a essa população, danos estes que não podem ser restringidos aos danos geológicos como foi posto no acordo vigente. Vale ressaltar que, nessas comunidades há evidências claras de dano geológico, como as rachaduras encontradas em grande parte dos imóveis e os buracos no solo que tem surgido na comunidade dos Flexais. Inclusive, essas evidências já resultaram em relatórios apresentados anteriormente a Defesa Civil de Maceió. Deste modo, essas comunidades remanescentes tem dos os motivos que justificam a necessidade de retirada dessa população, o que falta é o reconhecimento da situação de risco na qual estão inseridas e dos danos diretos e indiretos sofridos por estas devido a atividade de exploração da sal-gema há quatro décadas em seu solo.

Sendo assim, para fins de inclusão no programa de compensação financeira e apoio a realocação, deve ser considerado o passivo ambiental da Braskem como um todo, sendo feita a reparação integral dos danos a essas comunidades inseridas nas áreas de influência, com a remoção imediata e indenização destas.

Referências:

BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução n.001, de 23 de janeiro de 1986. Dispõe sobre critérios básicos e diretrizes gerais para o Relatório de Impacto Ambiental – RIMA. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 17 fev. 1986. Disponível em https://www.siam.mg.gov.br/sla/download.pdf?idNorma=8902. Acesso em: 08 de fev. 2022.

BRASIL. Lei Federal n.° 10.257 de 10 de julho de 2001: Estatuto da Cidade. Disponível em:  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm. Acesso em: 08 de fev. 2022.

CASTRO, Flávio Barbosa de. & LEAL, Rogério Gesta. As áreas de influência como forma de proteção ao direito fundamental ao meio ambiente urbano. Revista Paradigma, Ribeirão Preto-SP, a. XXIV, v. 28, n. 3, p. 201-214, set/dez 2019 ISSN 2318-8650.

MALAFAIA, Raimunda Maciel Sacramento de. Passivo ambiental: Mensuração, Responsabilidade, Evidenciação e Obras Rodoviárias. IX SINAOP novembro de 2004 TCE/RJ – Rio de Janeiro.

OMOTO, João Akira. A visão do Ministério Público sobre o EIA e o Licenciamento Ambiental. Manaus, junho de 2006. Disponível em: http://abce.org.br/downloads/IIseminariomeioambiente/joao_akira_omoto.pdf. Acesso em 05 de março 2022.

ONU. Declaração do Rio de Janeiro sobre o meio ambiente e o desenvolvimento. Rio de Janeiro, junho de 1992. Disponível em:  https://www.scielo.br/j/ea/a/szzGBPjxPqnTsHsnMSxFWPL/?format=pdf. Acesso em: 08 de fev. 2022.

 

* Neirevane Nunes Ferreira de Souza

Bióloga e mestra pela UFAL, professora da rede publica de Maceió, ex-moradora do bairro de Bebedouro e membro do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem.

 

 

 

 

 

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