Desde 2019, em parceria com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração assumiu como tarefa acompanhar e promover análises críticas das medidas governamentais que ameaçam os povos indígenas no contexto da política mineral brasileira. O presidente da República, desde que assumiu o mandato, colocou como discurso central executar uma política permissiva ambientalmente e que possibilitasse a abertura das terras indígenas para investimentos empresariais, dentre os quais a atividade mineradora. 

 

Desde última quarta-feira (2), deputados governistas se articulam fortemente e buscam assinaturas para requerimento de urgência para votação do PL 191/2020. E caso consigam as 257 assinaturas necessárias para tal, o Projeto de Lei pode ir à votação em Plenário sem que os povos indígenas participem das discussões, sem audiências públicas, sem a constituição de Comissão Especial na Câmara, como é necessário em qualquer trâmite de Projetos de Lei.

Esta pesquisa mapeia os principais agentes e seus interesses em volta da tramitação do Projeto de Lei (PL) nº 191, apresentado pelo Executivo, em 6 de fevereiro de 2020, para regulamentar a mineração e outras atividades econômicas em terras indígenas. O estudo foi iniciado em 2019, quando a proposta do governo ainda não havia sido enviada ao Congresso Nacional. Nessa primeira fase, realizamos entrevistas por telefone ou enviamos um roteiro de perguntas por e-mail abordando os seguintes temas: posicionamento em relação à eventual liberação da mineração industrial e do garimpo em terras indígenas; possíveis prioridades ou modificações nos critérios de concessão dos títulos minerários e mecanismos de consulta, participação nos ganhos e veto das comunidades indígenas. 

Após a divulgação do PL, entramos em contato novamente para atualizar o posicionamento dos agentes antes entrevistados. Nos dois momentos, quando não foi possível obter uma resposta, a estratégia foi buscar fontes secundárias de informação em veículos de imprensa, redes sociais e nas audiências públicas realizadas no Congresso Nacional sobre a matéria. 

Os pontos centrais deste relatório são: 

  • As pressões para regulamentar a exploração dos recursos minerais em terras indígenas se intensificaram a partir do começo da década de 1980. Com a posterior instauração do debate para a formulação da nova Constituição, grupos empresariais e midiáticos utilizaram-se de estratégias de calúnia, difamação e perseguição contra os povos originários e seus apoiadores para pressionar os deputados constituintes e desmoralizar a pauta indígena. 
  • A minuta do PL 191/2020 foi produzida por diversos órgãos do Executivo Federal sem a participação dos povos originários. A análise de seu conteúdo demonstra como os direitos de decisão ou qualquer outro mecanismo de restrição ao avanço da mineração foram removidos da proposta, ainda que tenham sido sugeridos pela Fundação Nacional do Índio (Funai)
  • O Projeto de Lei, enviado ao Congresso Nacional em fevereiro de 2020, a despeito de seguir certas determinações constitucionais, fragiliza Quem é quem no debate sobre mineração em terras indígenas 13 o papel a ser cumprido pela Funai, não concede o poder de veto às comunidades afetadas e abre as terras indígenas à mineração industrial, ao garimpo e à exploração de hidrocarbonetos e recursos hídricos para a geração de energia elétrica. 
  • Desde o início do mandato de Jair Bolsonaro, o governo age de maneira articulada com diferentes segmentos do setor mineral, entre mineradoras, garimpeiros e suas respectivas entidades representativas, além de parlamentares e governadores, para regularizar a abertura das terras indígenas para a mineração e diminuir a repressão aos garimpos ilegais. Ao mesmo tempo, o Executivo também vem incentivando a liberação da garimpagem através de leis estaduais nos estados chefiados por governadores alinhados com a política federal na região da Amazônia. 
  • A ampla receptividade oferecida por diferentes ministérios aos garimpeiros e mineradoras, não se reproduz em relação às lideranças indígenas ou às organizações representativas dos povos originários contrárias à atividade mineral em seus territórios. • O governo federal, através de diversas medidas e programas, tem defendido a mineração em terras indígenas como prioritária para o setor. Além disso, o PL 191, ainda que tenha sido alvo de críticas pontuais, recebeu o apoio de entidades empresariais das grandes mineradoras e do garimpo; das frentes parlamentares da mineração e do agronegócio; de deputados e senadores com larga atuação na defesa da atividade garimpeira; de veículos da grande imprensa e de apenas duas associações indígenas. 
  • Do lado oposto, a proposta tem sido combatida pela frente parlamentar dos povos originários, pela grande maioria de lideranças e associações indígenas e pelo Ministério Público Federal. 
  • As entidades empresariais das grandes mineradoras e das empresas de pesquisa mineral defendem a realização da atividade em terras indígenas, a ser exercida exclusivamente por mineradoras organizadas e sem a concessão do poder de veto aos povos indígenas. • Identifica-se uma tensão entre as representações de garimpeiros e de mineradoras quanto a abertura ou não das terras indígenas à garimpagem. 
  • Quase a totalidade das organizações indígenas, principalmente as de representação nacional, vêm se posicionando contrárias à pauta do PL 191 e da garimpagem em terras indígenas, com poucas vozes dissidentes.
  • A grande mídia vem se colocando a favor da regulamentação da proposta, ainda que possa a vir questionar alguns conteúdos dispostos no Projeto de Lei.

ERRATA
Na página 7 do livro foi necessária uma correção quanto a dado de área de terras indígenas: “As terras indígenas atualmente correspondem a 725 terras em diferentes fases do procedimento demarcatório, sob uma extensão de 117 milhões de hectares, ou 13,8% do território nacional, segundo o Instituto Socioambiental (2021)”

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