No bairro de Piquiá de Baixo, em Açailândia (MA), cerca de 1.100 pessoas sofrem cotidianamente com a poluição. O bairro já existia a pelo menos 15 anos antes da chegada das Siderúrgicas Viena, Fergumar, Pindaré, Simasa e Gusa Nordeste, que se instalaram no bairro a partir do final dos anos 80, com as operações cotidianas de produção de ferro-gusa, que provocam até os dias atuais uma forte poluição do rio, ar e solo prejudicando a saúde dos moradores. O bairro também sofre impactos gerados pela da Estrada de Ferro e do entreposto de minério da Vale S.A.
Desde 2005, a Associação Comunitária dos Moradores do Piquiá (ACMP) tem se mobilizado frente a essas violações e encaminhado denúncias a distintos órgãos a respeito da grave situação decorrente dos altos índices de poluição. Laudos técnicos realizados por profissionais idôneos já atestaram pelo menos desde 2007 a inviabilidade da convivência entre as indústrias e assentamentos humanos naquela localidade.
Estudos realizados nos últimos anos com moradores de Piquiá de Baixo têm atestado o alto índice de enfermidades, especialmente respiratórias, de pele e de visão, muitas delas levando moradores a óbito ou a comprometimentos permanentes.
Um estudo de impacto em direitos humanos, realizado pela Federação Internacional dos Direitos Humanos (FIDH), em colaboração com as organizações brasileiras Justiça Global e Justiça nos Trilhos, redundou na publicação, em 2011, do relatório “Brasil: Quanto Valem os Direitos Humanos – Os impactos sobre os direitos humanos da indústria da mineração e da siderurgia em Açailândia”, com recomendações ao Estado brasileiro e às empresas. Atualmente esse relatório está sendo atualizando para indicar se houve mudanças no quadro apresentando e se as recomendações feitas ao Estado brasileiro foram ouvidas.
O relatório da FIDH atestou, de maneira alarmante que 59% das famílias de Piquiá de Baixo tiveram alguém com febre nos quinze dias que antecederam a pesquisa. Tal constatação é suficiente para ilustrar o nível de insalubridade daquela localidade, que aliás já foi classificada em trabalho de perícia técnica realizada em 2007, como inviável para a manutenção da vida humana.
A situação vivida pelos moradores de Piquiá de Baixo fez com que, há, pelo menos, oito anos se iniciasse uma negociação, conduzida pelo Ministério Público do Estado do Maranhão, em vista do reassentamento coletivo de toda a comunidade. Um documento com as “diretrizes para o reassentamento de Piquiá de Baixo”, elaborado ainda em 2010, tem servido como principal referência para a tomada de medidas progressivas rumo à concretização do reassentamento de 312 famílias.
A partir de uma intensa mobilização popular, com ocupações da BR 222, nas portarias das empresas siderúrgicas, denúncias a Organização das Nações Unidas (ONU), a Comissão interamericana de Direito Humanos, o caso de Piquiá de Baixo alcançou visibilidade e apoio em nível nacional e internacional, a ACMP conseguiu levar as empresas, consideradas responsáveis pelas violações socioambientais, a uma mesa de longa negociação extrajudicial, mediada pelo Ministério Público Estadual e a Defensoria Pública Estadual do Maranhão.
Nas mesas de negociações conseguiu-se o aporte das empresas siderúrgicas para a indenização do terreno do reassentamento, que a prefeitura de Açailândia desapropriou por interesse social e já doou à associação de moradores. A Fundação Vale concordou em contribuir com uma parcela adicional de financiamento por unidade habitacional, somando-se assim à contribuição do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), do Governo Federal.
Isso significa que coube à Associação Comunitária dos Moradores do Pequiá (ACMP) a responsabilidade pela obra, em regime de autogestão dentro do programa MCMV. Nesse sentido, a ACMP elaborou seu projeto urbanístico e habitacional básico, com o auxílio de uma assessoria técnica independente (CTAH Usina), o qual foi apresentado oficialmente à Caixa Econômica Federal (CEF) em dezembro de 2013. O projeto urbanístico habitacional foi custeado pelo TAC firamdo com pelas empresas siderúrgicas, depois de mobilizações da comunidade.
Em 17 de dezembro de 2014, a Gerência Executiva de Habitação da CEF em São Luís enviou uma comunicação à ACMP declarando que o projeto de reassentamento havia sido aprovado e encaminhado, naquela data, para o Ministério das Cidades para seleção do projeto. Porém o projeto ficou empancado devido algumas pendências.
Passado mais um ano em 31 de dezembro de 2015, o projeto foi, enfim, selecionado pelo Ministério das Cidades, para receber financiamento do Programa ‘Minha Casa Minha Vida’. Após a aprovação, em abril de 2016 foi firmado o primeiro contrato entre a Caixa Econômica Federal e a ACMP para a “fase 1” do projeto (“pagamento de assistência técnica e despesas com legalização em terrenos transferidos e em processo de transferência pelo poder público ou de propriedade da Entidade Organizadora, para futura construção das unidades habitacionais”), ainda em curso.
Dando seguimento a essa primeira fase em fevereiro de 2017 a ACMP protocolou junto à CEF em São Luís o resultado da última etapa de elaboração do projeto urbanístico executivo. O projeto foi analisado pela Caixa, que em repetidas ocasiões solicitou ajustes e adequações às normas estabelecidas pelo Programa MCMV.
Ainda hoje existem divergências entre as necessidades planejadas em autogestão pela Associação de Moradores e sua assessoria técnica, os fundos efetivamente à disposição e as regras definidas pelo programa federal que, como acenado acima, não contempla casos de reassentamentos forçado de comunidades preexistentes e restringe portanto as condições de contratação do projeto. Essas divergências estão sendo negociadas pela ACMP junto ao Ministério das Cidades e à CEF e estão sendo superadas pouco a pouco e construção das residências no novo bairro se torna cada vez mais próxima.
É importante esclarecer que, mesmo que o projeto esteja sendo apoiado com recursos do Programa Minha Casa Minha Vida, faltam ainda os recursos necessários para a construção e manutenção de equipamentos públicos (escolas, posto de saúde, entre outros) ou outros equipamentos sociais. Além disso, recursos adicionais serão necessários também para cobrir a contrapartida que o Programa MCMV normalmente exige dos moradores. A ACMP está buscando meios para garantir também equipamentos públicos.
Mesmo buscando o reassentamento longe da poluição, os moradores de Piquiá de Baixo, não deixaram de lado a luta contra a poluição. A ACMP e seus parceiros vêm ao longo desses anos requerendo junto às autoridades competentes medidas efetivas para o controle e a diminuição da poluição. Nesse sentido, diversos documentos foram enviados por exemplo ao Ministério Público do Estado do Maranhão e à Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Maranhão, com pedidos de acesso a informação e de ações de fiscalização das empresas poluidoras.
Atualmente as siderúrgicas Pindaré e Simasa, estão inoperantes e foram vendidas para empresa Suzano Papel e Celulose. A siderúrgica Fergumar, também encerrou suas atividades. Mesmo com essas empresas estando inoperante a poluição no bairro de Piquiá continua se agravando, pois novos atores assumiram o posto deixado pelas três siderúrgicas. Se instalaram no bairro um a empresa Aço Verde Brasil, para fabricação de lâminas de aço e a Cimento Verde Brasil, que juntas lançam substâncias altamente poluentes.
E assim a comunidade de Piquiá segue trilhando o seu caminho lutando contra a poluição provocadas por grandes empresas e buscando garantir um reassentamento onde as os moradores possam viver com mais dignidade.
Associação de Moradores de Piquiá de Baixo
Assessoria Justiça nos Trilhos.
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