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O Interesse da Mineração sobre o Marco Temporal

O Marco Temporal, Projeto de Lei (PL) 490/2007, foi aprovado na Câmara dos Deputados no dia 30/05/2023 com uma votação de 283 deputados votando a favor, 155 contra e 1 abstenção, além de 73 deputados terem faltado. O projeto tem como objetivo central limitar as demarcações de Terras Indígenas no país, reduzindo os direitos dos povos originários ao território. Agora ele está em tramitação no Senado Federal, como PL 2903/2023.

A versão aprovada limita as demarcações de terras indígenas as situações onde existia comprovada habitação e utilização em caráter permanente dos povos indígenas na área requerida na data de 5 de outubro de 1988, quando foi promulgado o texto constitucional. Os processos em andamento ou demarcações anteriores que não contemplam o novo texto terão que ser adequados ou revogados, de acordo com as condições de cada processo. Além disso, a proposta impede a ampliação das áreas indígenas já demarcadas. Dentre outros absurdos, ainda se prevê que em caso de alteração de traços culturais da comunidade indígena as terras podem ser retomadas pela União e considera as Terras Indígenas adquiridas como propriedade privada.

Na relação do PL aprovado com a atividade de mineração, a proposta diminuirá as áreas ocupadas por Terras Indígenas na atualidade, dificultará novas demarcações e proibirá aumento de áreas, abrindo e assegurando mais áreas para exploração mineral. Devemos ter em vista que a mineração hoje nessas áreas não é regulamentada. Deste modo, o Marco Temporal reduz os territórios planejados para serem livres de mineração.

No Art. 20, se coloca o interesse da política de defesa e de uma suposta soberania nacional acima dos direitos territoriais indígenas. Com isso, se permitiria, como consta no próprio projeto, expansão das malhas viárias e o resguardo das riquezas de cunho estratégico independente de consultas às comunidades indígenas ou órgãos indigenistas federais. Esse artigo abre brecha para a implantação, por exemplo, da atividade mineral e de sua infraestrutura (rodovias, ferrovias, minerodutos, etc.) nas Terras Indígenas, inclusive sem consulta. A ausência de consulta viola a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário. Outra brecha presente para o setor mineral é a possibilidade da promoção de atividades econômicas pelos próprios indígenas e em cooperação com não indígenas. Ainda deixa em aberto a possibilidade de contato com povos indígenas isolados para intermediar ação estatal de utilidade pública. Deste contexto, deve-se considerar que a mineração é compreendida como de utilidade pública.

O interesse pelas novas regras legislativas que podem possibilitar a abertura da mineração em Terras Indígenas é expresso pela votação expressiva da Frente Parlamentar da Mineração Sustentável. Os votos da bancada foram: 124 a favor, 37 contra, 1 abstenção e 32 faltantes (Gráfico 1).

Os 124 votos representaram, aproximadamente, 43,8% dos votos sim na Câmara, mostrando, assim, o quanto a bancada foi decisiva para a aprovação do PL (Gráfico 2). Os votos da bancada não foram totalmente uniformes, entretanto, aproximadamente 76,5% do total de votos da frente parlamentar foram favoráveis ao PL 490/07. Já em relação aos 283 votos totais a favor do projeto, representam aproximadamente 55,2% de todo o Congresso e, aproximadamente, 64,5% dos votos absolutos.

Os partidos da Frente Parlamentar da Mineração Sustentável também foram expressivos na votação. O Partido Liberal (PL), pela bancada, foi o que mais votou sim: 33 votos (Gráfico 3), todos os seus membros na Frente. Representou aproximadamente 26,7% dos votos da frente parlamentar. Em relação ao posicionamento de todos os parlamentares do partido (membros da frente e não), somente um voto foi contra o projeto e 83 a favor. Este partido é o que tem maiores representantes na Câmara, com 99 deputados, seguido do Partido dos Trabalhadores (PT), com 57 deputados. O PT, que tem sete representantes na bancada da mineração, foi totalmente contra ao PL 490/07. Dos parlamentares que compõem a frente parlamentar 100% do PT, Partido Verde (PV), Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Dos membros do Partido Democrático Trabalhista (PDT) que compõem a Frente da Mineração, somente um de oito votou a favor do PL. O segundo partido com mais votos pela bancada da Mineração foi o União Brasil, que dos 50 votos absolutos, 48 foram a favor, sendo 24 deles de representantes da Frente Parlamentar. Dentro da Frente os partidos mais representativos, Republicanos, Partido Progressista, Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e Partido Social Democrático (PSD) votaram em sua maioria a favor do projeto.

As Unidades Federativas (UF) dos deputados da Frente da Mineração que mais votaram a favor foram, em ordem decrescente: Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul, Bahia e Rio de Janeiro (Gráfico 4). Cada um destes teve mais de 10 votos cada, representando ao total 61 votos a favor, sendo quase 50% dos votos favoráveis dentro da Frente.

Os dados da votação mostram que não só a bancada do Agronegócio, mas também a bancada da Mineração foram essenciais para aprovação do desmonte dos direitos indígenas e a aprovação do marco temporal. Destacamos ainda que as brechas legais deixadas pela proposta legislativa abrem a possibilidade do avanço da mineração nestes territórios, o que mostra que os interesses do setor operaram em flexibilizar e abrir as fronteiras para expansão mineral em áreas ainda indisponibilizadas.  

Por:

Luiz Jardim Wanderley

Professor da Universidade Federal Fluminense e membro do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração

Luana de Abreu Campos Pires

Graduanda de Ciência Ambiental da Universidade Federal Fluminense

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